Thursday, November 23, 2006

Nunca vou esquecer daquela tarde assistindo Popeye...


Uma das coisas que sempre me preocuparam é como dar a alguém uma notícia de morte. Como jornalista espero nunca ter que chegar a trabalhar em obituários. Há aqueles que até gostam disso, alguns tratam o assunto com uma mistura de morbidez e saudosismo, outros são do tipo que se espremermos o jornal depois de impresso não seria surpresa se escorresse sangue... E para falar da morte de um dos grandes diretores de cinema da atualidade, não posso parar de imaginar como alguns outros grandes cineastas dariam essa notícia. É como imaginar um filme de Kubrick feito por Tim Burton.
Veja bem, estilo de escrita não se difere em nada de estilo cinematográfico, é a marca pessoal de um autor ou diretor naquele filme. É como observar uma obra de arte. Algumas pessoas dotadas de maior sensibilidade conseguem ler a tela de forma a conseguir entender toda a situação retratada mesmo sendo uma tela abstrata. É assim que eu costumo categorizar o cinema: como uma forma mais lúdica e completa de expressar aquilo que estava no imaginário do diretor e do autor, uma forma de “comunicação de imaginários”. E por ser uma das formas mais completas de expressão do imaginário ela é tão acessível. Torna-se mais fácil para qualquer pessoa enxergar todo aquele extraordinário que o diretor e o roteirista imaginaram. É como ao invés de apenas ver uma tela de Van Gogh ouvir por duas horas o pintor discorrendo sobre o que ele estava sentindo e tentando mostrar na hora que pintou algum dos seus quadros (tendo ainda uma música como pano de fundo).
É por isso que eu respeito tanto o cinema. Não é qualquer pessoa que consegue fazer um filme, é preciso ser um artista completo de suas percepções e técnica. Talvez fazer cinema seja mais difícil do que pintar e imaginar um universo de Salvador Dalí (o próprio se aventurou no cinema junto com Buñuel). Mas em filmes o fantástico pode estar escondido através de um cotidiano, isso quem me ensinou foi Robert Altman. Ele conseguia em seus vídeos transmitir uma ilusão de realidade.
Sendo assim, eu fico muito triste em saber e ter que dar a notícia de que um dos grandes gênios, e literalmente artista, que apareceu no mundo cinematográfico nos últimos 50 anos veio a falecer nesta segunda feira devido a um câncer.
Desde o início da década de cinquenta Robert Altman vem dirigindo e produzindo filmes, tendo em sua filmografia de diretor cerca de 87 longas metragens. Meu primeiro contato com Altman foi quando assisti a um dos seus fracassos de bilheteria: “Popeye”. Deve ter sido o primeiro filme de época que eu assisti, devia der apenas uns 10 anos de idade, mas achei maravilhoso. Nunca achei que fosse possível recriar todo um universo dos anos 40 em detalhes como ele fez... E o mais fantástico dentro disso foi ele ter conseguido recriar o mundo maravilhoso de um desenho animado que marcou a minha vida. Era o encontro da realidade com a fantasia. Eu conseguia me imaginar naquele cotidiano da década de quarenta usando aquelas roupas, sentir o cheiro da maresia... Foi aí que a minha paixão pelo cinema começou e eu devo isso a Robert Altman. Hoje Altman além de precursor de uma paixão pessoal pelo cinema é o diretor de dois dos meus filmes favoritos: “Gosford Park” e “Vincent & Theo”.
Robert Altman é conhecido por ter sido o diretor de filmes considerados um marco para o cinema, como “Prêt-à-Porter” (1994), “MASH” (1970), vencedor da Palma de Ouro, “Short Cuts” (1993), “Gosford Park” (2001) e “Vincent & Theo” (1990), que narra a história de Van Gogh.

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