Wednesday, March 28, 2007

Um gigante adormecido


Ao passar pela Rua das Trincheiras, em Jaguaribe, é impossível não perceber o lindo casarão branco com traços de arquitetura Art Noveau que ainda impera em meio a prédios decadentes. Trata-se da sede de um revolucionário projeto cultural universitário criado pela Pró-Reitoria de Assuntos Comunitários (PRAC) na década de 70, o Núcleo de Arte Contemporânea. Tal Núcleo fez a cultura local ferver entre as décadas de 70 e 80 com um banho de arte de Vanguarda jamais visto na “província”. O projeto ainda existe. Porém, apenas na teoria. Seus dias de glória aconteceram entre o verão de 78 e o inverno de 85.

A idéia foi lançada em um seminário que ocorreu no Museu de Arte Assis Chateaubriand, em Campina Grande. Na ocasião, discutiu-se a criação de um Núcleo de Artes Plásticas e assim nasceu o NAC. A época também era favorável à sua criação. O Estado estava há 20 anos sem mostrar nada de novo no meio artístico. Tudo o que era produzido aqui estava nos moldes da Semana de Arte Moderna de 1922, portanto já não era mais algo de vanguarda.

Além disso, a UFPB também estava passando por um momento de transição com a gestão do reitor Lynaldo Cavalcanti – um dos defensores do NAC. Com o renomado artista plástico Antonio Dias (na época professor do Departamento de Artes da UFPB), Chico Pereira (também artista plástico) e o teórico Paulo Sergio Duarte à frente do projeto, a idéia seria utilizar o espaço para exposições que serviriam de estudo de Arte para estudantes de todas as áreas da UFPB. Essas exposições estariam abertas à comunidade local, fazendo ao mesmo tempo uma reciclagem da arte vista na cidade.

Porém, no Departamento de Artes da UFPB não havia professores que trabalhassem nessa área. Foi aí talvez o grande trunfo do NAC e ao mesmo tempo o que o fez entrar em decadência. Os diretores tiveram que fazer valer de suas influências no meio artístico para assim trazer exposições de grandes nomes da arte contemporânea mundial e brasileira. Para isso, o artista seria contratado como professor por seis meses. Nesse período ele daria aulas na Universidade, estaria à disposição dos alunos para estudos da sua obra e montaria o seu projeto de exposição. Para que isso tudo desse certo também foi fundamental o apoio da Funarte junto à Reitoria.

Com isso, o NAC se transformou num dos grandes pólos de Arte Contemporânea do país. “O NAC se tornou o eixo fora do eixo”, diz o artista plástico e crítico de arte Diógenes Chaves a respeito da importância nacional do NAC na época. Isso porque as grandes investidas artísticas estavam apenas no Sul do país com alguns movimentos como o “Nervo Ótico” (Porto Alegre), o MAM-Rio, MAC-SP e etc.

O projeto foi tão ambicioso que para demonstrar a sua importância estavam presentes no NAC em sua abertura os artistas Mário Pedrosa, Roberto Pontual, Carmem Portinho (ex-diretora do MAM-Rio e ex-diretora da Escola Superior de Desenho Industrial), Alberto Buettenmuller e Ziraldo. O NAC foi o primeiro lugar no Brasil a mostrar a fotografia como arte. Suas exposições eram pautas de grandes matérias do Jornal do Brasil e até do Le Monde. Foi também um dos primeiros lugares no país a mostrar os livros de arte e livros-arte. Em seus dias de glória, passaram pelo local artistas como Flavio Tavares, Gustavo Moura, Cláudio Tozzi, Fred Svendsen, Tunga, Breno Matos, Rubens Guerchmam e Paulo Roberto Leal.

A decadência do NAC começou em 85 quando o projeto já não dispunha do apoio financeiro que havia no começo. Além disso, o prédio passou dois anos sem funcionar. Quando aconteceu a reabertura já não havia interesse dos professores e artistas em continuar o projeto. A revolução artística já havia acontecido na cidade. Os fundadores do Núcleo não estavam mais na UFPB. Sendo assim, o projeto ficou abandonado às baratas. Chegando a ponto de exibir exposições de artesanato e cerâmica para as senhoras da “alta sociedade paraibana”. Os artistas locais sem entender o propósito do Núcleo voltaram-se contra o projeto alegando que este não dava vez aos artistas conterrâneos. Sendo assim, selou-se a “morte” do NAC.

Em 2000, o crítico de arte Fabio Queiroz (FabbioQ.) fez uma tentativa de retomada da ousadia das exposições do NAC. Ele organizou a curadoria de uma exposição chamada “Sem Título”. A investida não obteve os resultados esperados na época, porém foi algo que mexeu com a (mais uma vez) pacata cena artística de João Pessoa. A essa altura, o projeto não funcionava e nem teria como funcionar sem a ajuda financeira e interesse da Universidade em mantê-lo.

No final do ano passado, a professora do Departamento de Artes, Marta Penner, assumiu a direção do Núcleo com a idéia de reviver o gigante adormecido. Para isso, está tentando promover grandes exposições, além de reativar os cursos de cerâmica e litografia e os projetos de extensão do Departamento. Além disso, o curso de Educação Artística passou a ser separado em Artes Visuais, Teatro e Educação Musical. É provável que todas essas transições tragam bons frutos para o NAC. Entretanto, é necessário que o projeto atual seja reavaliado para que funcione de acordo com as condições vigentes.

Numa grande investida de Marta Penner à frente do Núcleo, estão em exposição as telas do artista suíço Dieter Ruckhaberle. O artista passa seis meses na Paraíba em seu atelier produzindo e seis meses em sua terra natal. Suas obras giram em torno de histórias, geralmente inspiradas no Oriente Médio. O tema da exposição em cartaz é “Abisague de Sunem e o Rei Davi”. As telas estarão no NAC até o dia 31 de Março.